Os efeitos da pandemia na saúde da população vão além da infecção por coronavírus. O distanciamento social, ainda necessário para evitar o contágio, e a sobrecarga do sistema de saúde público e privado fizeram com que muitas outras doenças não recebessem a atenção adequada.
Nesse sentido, muitos pesquisadores se dedicaram a prever e avaliar os impactos da pandemia no diagnóstico e tratamento de diversos tipos de câncer, uma das doenças em que a intervenção precoce, em muitos casos, significa chances de cura muito maiores.
Atrasos na realização de intervenções cirúrgicas já foram amplamente explorados em muitas pesquisas, especialmente em casos de câncer de bexiga com invasão muscular. De acordo com uma revisão sistemática publicada no periódico European Urology Oncology, envolvendo mais de dezenove estudos sobre o assunto, foi possível desenvolver algumas orientações na abordagem do câncer de bexiga para o período:
Durante as restrições causadas pela pandemia de Covid-19, pacientes com câncer de bexiga não invasivo de alto grau devem ser submetidos ao tratamento com BCG e terapia de manutenção.
Já para os tumores de alto risco, a cistectomia deve ter sido realizada assim que possível, com exceção para casos em que o risco pós-operatório de contrair Covid-19 seja grande em pacientes com comorbidades.
Além disso, de acordo com a literatura disponível, o atraso em até três meses na cistectomia radical pode ser seguro em casos de câncer invasivo, e a equipe médica deve priorizar o câncer de bexiga de alto grau, seja ele invasivo ou não, já que o impacto na sobrevida pode ser significativo.
Revisão sistemática oferece orientações a respeito do atraso no tratamento do câncer de bexiga
Antes da pandemia de Covid-19, dificuldades na marcação de exames e consultas, busca de diversas opiniões médicas, questões sociais, diagnósticos errados e comorbidades em pacientes foram motivos que resultaram num espaço de tempo maior entre o diagnóstico e o tratamento da doença.
Na revisão, quatro estudos encontraram uma associação significativa entre o retardo do diagnóstico em relação à cistectomia radical (cirurgia de remoção da bexiga). A partir da metanálise de três estudos com dados que consideravam o estágio do tumor, foi encontrado um risco aumentado de morte para os pacientes com atraso significativo.
Cinco estudos avaliaram a associação entre o tempo entre a conclusão da quimioterapia neoadjuvante e a cistectomia radical em relação à sobrevida. Dois deles demonstraram que demorar muito entre a quimioterapia e a cirurgia trouxe efeitos adversos na sobrevida dos pacientes, enquanto outro identificou que o estadiamento de tumores avançados estava associado aos atrasos.
Um dos estudos observou que pacientes que tiveram mais de 10 semanas entre o último ciclo de quimioterapia e a cirurgia de remoção da bexiga tiveram uma sobrevida global e específica do câncer mais baixa. Outra pesquisa descobriu que os atrasos na quimioterapia em mais de oito semanas estavam associados a um risco aumentado de avanço do tumor.
Entretanto, os pesquisadores não encontraram problemas em relação ao atraso de até seis meses do diagnóstico à cistectomia radical, nos casos em que a quimioterapia foi administrada. Esse pode ser um indicador de que os atrasos na administração da quimio podem ter um impacto maior, durante a pandemia, do que o atraso na cirurgia.
Vale ressaltar, também, que os tumores da bexiga que não invadiram o músculo podem ser divididos entre baixo e alto grau e a metanálise parece apontar que os atrasos são mais propensos a causar danos em pacientes com doença de alto grau do que naqueles com doença de baixo grau.
Acredito que, num futuro próximo, iremos saber as consequências do atraso na administração do tratamento adequado em pacientes com câncer de bexiga por meio de dados específicos desse período. Hoje, já sabemos que o impacto no diagnóstico do câncer de rim foi muito significativo, por exemplo.
Por fim, se o seu tratamento foi impactado pela pandemia, não se desespere e mantenha o acompanhamento médico adequado, certo?
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